sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Eleição, valetudo, mídia e ética... e o Brasil

Tomei a liberdade de reproduzir carta do intelectual Leonardo Boff devido à sua clareza, exposição objetiva e contundente. Espero que a leitura seja agradável e proveitosa no sentido de nos fazer refletir no papel dos veiculos de comunicação e na qualidade da informação veiculada e incutida em nossas mentes e subconscientes.

Espero que o autor nao se incomode com a reprodução do seu texto na integra, como segue:


"A Mídia comercial em guerra contra Lula e Dilma


Leonardo Boff*

Sou profundamente a favor da liberdade de expressão em nome da qual fui punido
com o “silêncio obsequioso ”pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser
preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o “Brasil
Nunca Mais” onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes
militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.

Esta história de vida, me avalisa fazer as críticas que ora faço ao atual
enfrentamento entre o Presidente Lula e a mídia comercial que reclama ser
tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de
idéias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está
havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota
eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a
candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de
fatos, a distorção e a mentira direta.

Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando vêem seus
interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia”
mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob
tutela a assim chamada opinião pública. São os donos do Estado de São Paulo, da
Folha de São Paulo, de O Globo, da revista Veja na qual se instalou a razão
cínica e o que há de mais falso e xulo da imprensa brasileira. Estes estão a
serviço de um bloco histórico, assentado sobre o capital que sempre explorou o
povo e que não aceita um Presidente que vem deste povo. Mais que informar e
fornecer material para a discussão pública, pois essa é a missão da imprensa,
esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.

Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos,
editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido à mais alta
autoridade do pais, ao Presidente Lula. Nele vêem apenas um peão a ser tratado
com o chicote da palavra que humilha.

Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista.
Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande
tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a
Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o
mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem
meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do
peão é na fábrica produzindo.

Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e
Reforma) “a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada,
antiprogresssita, antinacional e não contemporânea. A liderança nunca se
reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu,
pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes nem admirou
seus serviços ao país, chamou-o de tudo, Jeca Tatu, negou seus direitos, arrasou
sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação,
conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que continua achando que
lhe pertence(p.16)”.

Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os
pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles tem pavor
do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascedente
como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo
devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o
Presidente de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.

Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram
conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados de
onde vem Lula e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coronéis e de
“fazedores de cabeça” do povo. Quando Lula afirmou que “a opinião pública somos
nós”, frase tão distorcida por essa mídia raivosa, quis enfatizar que o povo
organizado e consciente arrebatou a pretensão da mídia comercial de ser a
formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à
ditadura da palavra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes
de informação e de opinião.

O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si
mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma
revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do
povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de
brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se
fizeram classe média baixa e de classe média baixa de fizeram classe média.
Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola,
a ganhar mais salário, em fim, a melhorar de vida.

Outro conceito inovador foi o desenvolvimento com inclusão social e distribuição
de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já
beneficiados à custa das massas destituídas e com salários de fome. Agora
ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias
e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual
há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas importa reconhecer
que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção
dos mais marginalizados.

O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora
e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que
assiste, assustada, o fortalecimento da soberania popular que se torna crítica,
não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática
do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas
delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava
preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico
que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos
sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA
faz questão de não ver, protagonista de mudanças sociais não somente com
referência à terra mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de
produção.

O que está em jogo neste enfrentamento entre a mídia comercial e Lula/Dilma é a
questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocolonial, neoglobalizado e no
fundo, retrógrado e velhista ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos,
antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para
construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes.

Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas
estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a
despeito das má vontade deste setor endurecido da mídia comercial e empresarial.
A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construído com
suor e sangue por tantas gerações de brasileiros."

*teólogo, filósofo, escritor e representante da Iniciativa Internacional da
Carta da Terra.

Um comentário:

Lucas Morais Santos disse...

Bom texto! Esse segundo turno está deprimente, namoral!