quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Apartheid de Interesses

Ao ler o artigo publicado na sessão Opinião do Jornal a A Tarde, edição do dia 23/08/2011, sob o título Apartheid urbano e, apesar da tentativa até certo ponto poética engendrada pelo seu autor, não pude deixar de me questionar sobre alguns pontos, que me pareceram equivocados na abordagem, sobre o caráter social do transporte público de alta capacidade, o que me motivou a contestar a visão veiculada.

Exclusão social em Salvador existe faz tempo e, com efeito, não me parece ser causada somente pelo modal de transporte, mas por todo um modelo de sociedade que temos, envolvendo questões conjunturais e estruturais muito mais profundas. A despeito da questão social, tão latente e patente em Salvador já de há muito, o autor esquece de observar suas raízes, analisando sob uma ótica bastante particular, apenas um de seus multiplos reflexos, que em sendo reflexo, não é causa.

Esqueceu de dizer que é preciso pensar a Cidade da Bahia a longo prazo, para além de 2014, e assim se buscar corrigir o equívoco histórico (equívoco!?)que ocorreu em Salvador, de fazer do modo rodoviário a peça fundamental do modelo de transporte de passageiros, quando deveria ser ele complementar a um sistema de alta capacidade integrado e diversificado em seus modais (Metrô, Trem, VLT's, Sistemas de estacionamentos...), pois no que tange ao sistema de tranporte, os modais deveriam ser complementares e não concorrentes.

A meu ver, em sua avaliação o autor parte de pressupostos inconsistentes para justificar apenas o descontentamento de sua Corporação com a possibilidade de não exercer o controle do modal proposto para a Avenida Paralela, como o faz com todo o restante do sistema de transporte coletivo em Salvador, que no seu atual modelo de gestão, nada tem de solidário, inclusivo, justo ou socialmente responsável. Mas, tomando emprestada a sua poética, certamente a "garotinha carioca" se impressionaria com as filas para validar smartcards e mesmo com a forma como é gerenciado o tal cartão, que tem nome suigeneris (cartão-esperto...); teria ela se alarmado, tentando entender a equação das letrinhas, dessa famigerada integração aberta que nem abre nem integra! Pararemos por aqui, não quero traumatizar tão doce criança carioca, como já devem estar as soteropolitanas .

O referido autor sabe, francamente, que o problema central de sua motivação literária não está no “apartheid” causado a partir do eixo estruturante das vias, nos modais utilizados, ou na exclusão de bairros populares (já excluídos desde sempre, mesmo no modelo rodoviário existente) e sim no apartheid de interesses corporativos de quem vai ganhar o quê e quanto... Em quanto poder econômico está em jogo nessa disputa de interesses incertos, pois dentre todas as incertezas somente uma é inexoravelmente certa: o perdedor tem sido o cidadão de Salvador.